sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Abaixo, a terceira e última parte da longa entrevista de Lula ao Estadão. Aqui ele fala de alianças e de aliados, inclusive os incômodos. E defende a postura da diplomacia brasileira em relação ao Irã. Vou pedir licença aos amigos para comentar mais tarde, dizendo no que concordo e no que discordo. É que você viu que a faina aqui começou de madrugada, ainda, e foi duro achar este texto integral para compartilhar com vocês.

Deixar o governo de Minas para o PMDB de Hélio Costa facilita a vida de Dilma junto à base aliada?
A aliança com o PMDB de Minas independe da candidatura ao governo de Estado. O Hélio Costa tem me dito publicamente que a candidatura dele não é problema. Ele propõe o óbvio, que se faça no momento certo um estudo e veja quem tem mais condições e se apoie esse candidato. Acho que os companheiros de Minas, tanto o Patrus Ananias quanto o Fernando Pimentel se meteram em uma enrascada. Estava tudo indo muito bem até que eles transformaram a disputa entre eles em uma fissura muito ruim para o PT.Como a política é a arte do impossível, quem sabe até março eles conseguem resolver o problema deles.


A desistência da pré-candidatura do deputado Ciro Gomes(PSB-CE) facilitaria a vida de Dilma?
O Ciro é um companheiro por quem tenho o mais profundo respeito. Eu já gostava do Ciro e aprendia respeitá-lo.Um político com caráter. E, portanto, eu não farei nada que possa prejudicar o companheiro Ciro Gomes. Eu pretendo conversar com ele, ver se chegamos à conclusão sobre o melhor caminho.


Ele diz que o“santo Lula” está errado.
É preciso provar que o santo está errado.É por isso que eu quero discutir.
O sr. ainda quer que ele seja candidato ao governo de SãoPaulo?
Se eu disser agora,a minha conversa ficará prejudicada.


O senador Mercadante pode ser o plano B?
Não sei.Alguém terá de ser candidato.

O Ciro tem dito que a aliança da ministra Dilma com o PMDB é marcada pela frouxidão moral.
Todo mundo conhece o Ciro por essas coisas. Mas acho que ele não disse nada que impeça uma conversa com o presidente.

O que se teme no Temer? Ele é o nome para vice?
O Michel Temer, neste período todo que temos convivido com ele,que ele resolveu ficar na base e foi eleito presidente da Câmara, tem sido um companheiro inestimável. A questão da vice é uma questão a ser tratada entre o PT, a Dilma e o PMDB.

O sr. não teme que Dilma caia nas pesquisas após sair do governo?
Ela vai crescer.

Mas sozinha?
Ela nunca estará sozinha.Eu estarei espiritualmenteao lado dela (risos).

Há quem tenha ficado assustado com a foto do sr. abraçando o Collor,depois de tudo o que passou na campanha de 1989.
O exercício da democracia exige que você faça política em função da realidade que vive. O Collor foi eleito senador pelo voto livre e direto do povo de Alagoas, tanto quanto foi eleito qualquer outro parlamentar. Ele está exercendo uma função institucional e merece da minha parte o mesmo respeito que eu dou ao Pedro Simon, que de vez emquando faz oposição, ao Jarbas Vasconcelos, que faz oposição. Se o Lula for convidado para determinadas coisas, não irá. Mas o presidente tem função institucional. Portanto,cumpre essa função para o bem do País e, até agora,tem dado certo. Fui em uma reunião com a bancada do PT em que eles queriam cassar o Sarney. Eu disse: muito bem, vocês cassam o Sarney e quem vem para o lugar?

O sr.acha que o eleitor entende?
O eleitor entende, pode entender mais. Agora, quem governa é que sabe o tamanho do calo que está no seu pé quando quer aprovar uma coisa no Senado.

O governo depende do Sarney no Senado? O único punido até agora foi o Estado,que está sob censura.
O Sarney foi um homem de uma postura muito digna em todo esse episódio. Das acusações que vocês(ojornal)fizeramcontrao Sarney, nenhuma se sustenta juridicamenteeotempovaiprovar. O exercício da democracia não permite que a verdade seja absoluta para um lado e toda negativa para o outro lado. Perguntam: você é contra a censura? Eu nasci na política brigando contra a censura.Exerço um governo em que eu duvido que alguém tenha algum resquício de censura. Mas eu não posso censurar que os Poderes exerçamsuasfunções. Eu não posso censurar a imprensa por exercer a sua função de publicar as coisas, nem posso censurar um tribunal ou uma Justiça por dar uma decisão contrária. Deve ter instância superior, deve ter um órgão para recorrer.

O sr.e o PT lideraram o processo de impeachment de Collor e nada, então, se sustentou juridicamente porque o STF absolveu o ex-presidente. O sr.está dizendo que o jornal não deveria publicar as notícias porque não se sustentariam juridicamente? Os jornais publicam fatos…
Não quero que vocês deixem de publicar nada. Minha crítica é esta: uma coisa é publicar a informação, outra coisa é prejulgar. Muitas vezes as pessoas são prejulgadas.Todosos casos queeuvidoSarney,deemprego para a neta, daquela coisa, eu ficava lendo e a gente percebia que eram coisas muito frágeis. Você vai tirar um presidente do Senado porque a neta dele ligou para ele pedindo um emprego?

O caso da neta é o corporativismo,o fisiologismo,os atos secretos…
O que eu acho é o seguinte: o DEM governou aquela Casa durante 14 anos e a maioria dos atos secretos era deles. E eles esconderam isso para pedir investigação do outro lado. É uma coisa inusitada na política.

O sr. acha que os fatos do “mensalão do DEM”, no Distrito Federal, sã ofatos inverídicos também?
No DEM tem um agravante: tem gravação, chegaram a gravar gente cheirando dinheiro.

No mensalão do PT tinha uma lista na porta do banco com o registro dos políticos indo pegar a mesada…
Vamos pegar aquela denúncia contra o companheiro Silas Rondeau, que foi ministro das Minas e Energia.De onde se sustentaaquela reportagem dizendo que tinha dinheiro dentro daquele envelope? Como se pode condenar um cara por uma coisa que não era possível provar?

O sr.tem dito,em conversas reservadas, que quando terminar o governo, vai passar a limpo a história do mensalão. O que o sr. quer dizer?
Não é que vou passar a limpo, é que eu acho que tem coisa que tem de investigar. E eu quero investigar. Eu só não vou fazer isso enquanto eu for presidente da República. Mas, quando eu deixar a Presidência, eu quero saber de algumas coisas que eu não sei e que me pareceram muito estranhas ao longo do todo o processo.

Quem o traiu?
Quando eu deixar a Presidência, eu posso falar.

Porque é que o seu governo intercede em favor do governo do Irã?
Porque eu acho que essa coisa está mal resolvida.Eo Irã não é o Iraque e todos nós sabemos que a guerra do Iraque foi uma mentira montada em cima de umpaís que não tinha as armas químicas que diziam que ele tinha. A gente se esqueceu que o cara que fiscalizava as armas químicas era um brasileiro, o embaixador Maurício Bustani, que foi decapitado a pedido do governo americano, para que não dissesse que não havia armas químicas no Iraque.

O sr.continua achando que a Venezuela é uma democracia?
Eu acho que a Venezuela é uma democracia.

E o seu governo aqui é o quê?
É uma hiper-democracia. O meu governo é a essência da democracia.

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